quinta-feira, 21 de abril de 2016

Xavier Zarco





CHAFARIZ DOS OLIVAIS

desenha o poema
o rumor da água

as mãos entregam-se à descoberta
das líquidas palavras
da terra

onde se abre a boca
e nasce a voz dos artífices

eis a pedra
a mãe de todas as árias

a ópera da vida

Xavier Zarco, in “Coimbra ao som da água”, página 20, edições Temas Originais, 2009.

25 de Abril de 2016


Imagem da net, em: www.kids.pplware.sapo.pt


Ai Abril de tantos e tantos sonhos
num facebook com inúmeros gostos,
trazes, hoje, pesadelos medonhos
com tanto pobre a pagar impostos.

Tantos discursos supérfluos-banais
tanta gente a falar, sempre, de cor,
tanta busca de paraísos fiscais
tanta destreza para criar “offshore”.

Tanta indulgência sem ter castigo
e de soslaio vemos tanto sem-abrigo
numa liberdade por se festejar.

De setenta e quatro és esquecido
com tanto capitão já omitido…
quem me dera te poder reencontrar!...

António MR Martins

sábado, 16 de abril de 2016

Severino Moreira





MAL MENOR

Vem até mim a solidão reinando
E chega nua e possante,

Com garras apertando
A revelar-se castradora e angustiante.

Sinto-a perigosamente em desmando
Abeirando-se obscena e abundante,

E mesmo que aporte branda
Ela impera pesada e arisca e aviltante.

Mas todo o mal traz um bem:
A solidão protege-me de gente farsante!

Severino Moreira, in “Desconexões (andar pelas fragas do caminho)”, série “mínima”, n.º 20, página 17, edições Temas Originais, 2016.

Navegando em tuas águas


Imagem da net, em: www.mensagenscomamor.com



Embarquei pelas vestes que detinhas
e naveguei no corpo do teu olhar;
dentro do esplendor de tuas vinhas
trouxe bagos para este marear.

Escolhi dispersas rotas nos contornos
onde o fragor cintilou seu brilhar,
desvendando em êxtase os adornos
que fortalecem maior apaixonar.

Flutuei inebriado em prazer,
içando velas ao vento sem ceder,
com a singela proa à descoberta.

Desfaleci olhando o destino
seguro ao leme sem perder tino
num enlace forte, à hora certa!...

António MR Martins

segunda-feira, 11 de abril de 2016

No Dia Mundial da Doença de Parkinson, a minha singela homenagem a um grande sofredor/lutador: Rogério Martins Simões (Romasi)




Por que sou triste?

Saber, quero saber, por que sou triste.
Querer, por mais querer, o riso ensejo.
Chorar? Não mais chorar é meu desejo.
Saber por que razão meu choro insiste?

No meio deste silêncio, e que persiste,
Razão tem a razão em que me revejo.
Chorar será o clamor do meu arpejo.
Saber, quero saber em que consiste.

Perguntei ao meu rio Tejo, a soluçar,
Que me desse a razão deste meu estar:
Saber, quero saber que fiz de errado?

Sorrindo para mim para que o visse,
Cuidai desse teu riso, e mais me disse:
- Chorar, e mais chorar, será teu fado
Meco, Praia das Biscas, 2013-12-12
 
Rogério Martins Simões (Romasi), in “Golpe de Asa no Sequeiro”, página 40, edições Chiado Editora, Maio, 2014.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Francisco José Lopes





Desencontros

Tenho a recordação
na mão direita
e na esquerda a vontade
de uma vida.
Tenho nas mãos o destino
e não lhe encontro o sonho.
Quisera fazer com estas mãos
o som de outra cantiga
e transformar este desejo
em realidade sentida.
Tenho nas mãos o sonho
e não lhe encontro o destino.

Francisco José Lopes, in “No tempo das musas”, página 39, edição do autor, 1999.

 
******
 
 
Francisco José Lopes é natural de Alfândega da Fé, a sua actividade profissional tem-se desenvolvido essencialmente na educação e no ensino, com algumas incursões  nas áreas da cultura e da comunicação. in "No tempo das musas" (seu primeiro livro de poesia).

Sonho jamais sonhado


Imagem da net, em: www.melanges.com.br



Era um sonho onde não entrava
girando à volta das inexistências,
amiúde dele eu despertava
e tudo parava em reticências.

Me fechavam os olhos pouco depois
dormindo o sonho se retomava,
agora nele entrávamos os dois
num desenrolar que ninguém esperava.

Três corridas, um sermão e uma queda,
uma ferida e uma labareda..
o condimento daquele momento.

Naquele enredo nos vamos abraçar
talvez dum beijo nos possamos amar…
acordando tudo acaba. Lamento!...

António MR Martins

domingo, 3 de abril de 2016

Luís Altério





[se volta e meia penso no dia]

se volta e meia penso no dia?
- penso, penso…
o que ele,
o dia,
exerce em mim
para o temer?
- não sei, não sei…
o que sei é
que é minha tarefa
pensar no dia.

Luís Altério, in “Coisa em terceto de assim e Essa cisma que é o dia”, n.º 16, da série “mínima”, página 26, edições Temas Originais, 2016.

A tua diferença é um poema





Levo do teu sorriso
uma simples estrela
cheia de brilho persistente.

Levo da tua voz
um desabafo
com doçura inteligente.

Levo dos teus gestos
a plena determinação
dum afago permanente.

Levo do teu abraço
a singela razão
de uma semente diferente.

António MR Martins