sexta-feira, 5 de junho de 2015

Luís Filipe Marcão





14

Ainda há pouco
o meu vizinho
se pendurou
numa corda
de desespero
e se suicidou.

Pensa ele
que morreu.
Mas pelo contrário
ficou mais vivo!
Agora todos
falam do caso.
Uma aranha má
teceu-lhe aquelas ideias
por dentro da cabeça,
e ele lançou-se da trave
do fumeiro
como se fosse
vulgar salpicão,
bandeira arreada
contra as agruras
desta vida.
Ficou assim rígido,
olhos de fumo,
tão inteiro
a protestar
contra o futuro,
pendurado
na trave do fumeiro.
Que a outra…
a trave dos dias
onde existiu,
carunchou de tristeza
com letras por pagar,
e ele já não sabia
(ou então esqueceu)
com que palavras
poderia enfeitar
o poema da vida.

Luís Filipe Marcão, in “No Remanso das Palavras Inquietas”, páginas 25, 26 e 27, edições Europress, colecção: Subterrâneos/Espontâneos, 2015. 

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