domingo, 27 de junho de 2021

Lurdes Rebelo

 

Capa do livro "Rasgos de Saudade", de Lurdes Rebelo


[Na lassidão das noites de insónia]
 
Na lassidão das noites de insónia
No desalinho das horas lentas
As lembranças falam-me de ti
 
Ardes-me no abraço e no beijo
Amo-te baixinho dentro do silêncio
Ante a luz fria da noite
 
Adormeço,
no desassossego da alma
E a saudade continua
A permear os meus sonhos
 
Lurdes Rebelo, in “Rasgos de Saudade”, página 43, edições Projecto Foco, Julho de 2020.

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Contrastes

 

Imagem na net.


No lindo jardim onde te relanças
libertam-se sólidos novos rumos,
nos perfis das tuas múltiplas danças
surgem condimentos dos teus aprumos.
 
Nesse teu jardim onde te relanças
ressurge uma dança esquecida,
prenhe duma luz que então alcanças
perante imagem turva da vida.
 
Nesse relançar tão surpreendente
que te acicata nessa vertente
alcandoras-te ao grande patamar.
 
Mostras a doce dança venerada
com a produção da luz encontrada
derradeiro alcance a ultimar.
 
 
António MR Martins   

quinta-feira, 17 de junho de 2021

Assertivo caminhar

Imagem na net.

 

Um baldio concedido
na natureza carente,
gerou um amor perdido
da forma mais indecente.
 
As fragrâncias ditaram
aptidões pelo desejo,
desde logo indicaram
o valor que tem um beijo.
 
Os corpos se entenderam
na plenitude vigente,
como tal reconheceram
a sedução eminente.
 
Desbloquearam conceitos
em gestos manuseados,
sem querer falar dos peitos
outrora lisonjeados.
 
Num respirar ofegante
foram desbravadas vias,
ante fulgor delirante
e outras burocracias.
 
Apelo em consonância
tornou omnipresente,
factor de intolerância
em causa imprevidente.
 
Os beijos soaram depois
vazios de exactidão,
numa conivência a dois
pelo prazer e emoção.
 
Êxtase total em união
empolgante e sublime,
era a vulva a razão
do engrossar deste vime.
 
Sem apelo nem agravo
fecundo foi o caminho,
saboreando o travo
de engolir tão bom vinho.
 
António MR Martins


segunda-feira, 14 de junho de 2021

Intervalo

 

Imagem na net.


Era primavera
e o campo estava repleto de flores.

Os pássaros cantavam
denotando uma inesgotável alegria.
 
De um momento para o outro
tudo de modificou.
 
Foi um sonho
apenas
e somente
um sonho.
 
António MR Martins

terça-feira, 8 de junho de 2021

Nudez infinita

Imagem na net.

 

Na poeira do chão risco traços sós
espalhados na desconformidade,
numa sã nudez desprovida de nós
sem rigor pelas linhas da verdade.
 
Alguns traços soltos desalinhados
esbarrando em pedaços sólidos,
que se descobrem desacompanhados
em nus de movimentos sórdidos.
 
Pela imaginação retalhada
se preme a veia aniquilada
de um sangue estancado sem fluir.
 
Estabelece-se um labirinto
nas linhas invisíveis que pressinto
ao despido infinito do porvir. 
 
 
António MR Martins

domingo, 6 de junho de 2021

José Luís Peixoto

 

Capa do livro "A Casa, a Escuridão",
de José Luís Peixoto


O ESCRITOR
 
ele disse não sei porque escrevo o teu nome.
eu olhei para ele. eu disse o meu nome não
é tudo o que podes escrever.
 
ele escrevia o meu nome num papel. ele sentava-se
numa cadeira e o luar era a luz de um candeeiro
sobre as palavras escritas.
 
ele disse amo-te.
 
ele disse tenho medo que um dia deixe de poder
escrever o teu nome. eu disse o meu nome não
é tudo o que podes escrever.
 
ele escreveu o meu nome durante muitos anos.
e eu perguntei porque continuas a escrever
o meu nome? ele olhou para mim. e perguntou
quem és tu?
 
José Luís Peixoto, in “A Casa, a Escuridão”, página 31, edições Quetzal Editores, Julho de 2014.