quarta-feira, 29 de agosto de 2012

A SÍNTESE

 
 
 

Ando a fazer outra alma.
Refazê-la? Nem pensar!
São tantas as noites de breu,
que pouco fica de luar!

Ando a fazer-me contigo,
tu e eu mundo plural.
Alma nova?
Outra verdade?
Tu em tese?
Minha a antítese?
Os dois na síntese
a que chamam novidade,
e a que eu chamo mudança.

Perco a alma se for o não,
mas do sim sou a atitude.
Quero a alma em sonho na mão
para fazer a nova idade
da minha construção.

Filipe Antunes dos Santos

in livro "Respiração poética pelo Natal", página 32, edições Temas Originais, 2011

Apocalipse ou o mundo a quem manda

 
Foto de Gonçalo Lobo Pinheiro - Jogos Paralímpicos, Londres 2012.
 
 
Perdoem-me este sarcasmo
que espevita a celeuma
fuga a um simples marasmo
evitando um velho tema
 
desculpem-me por este sentir
envolto em nuvens escuras
filtrado de um novo partir
para além das amarguras
 
sujeitem-me pelo subjugar
entre os itens das condições
resfriando um novo olhar
além das rudes opiniões
 
agitem-me esta memória
que se agrava e declina
neste presente sem história
onde ninguém mais imagina
 
sacudam-me estas poeiras
que nos abatem na milonga
pelo corrupio de asneiras
e tantas vendas da candonga
 
balancem-me equilibrado
pela entrega especial
dum produto adulterado
com certificado mundial
 
António MR Martins


domingo, 26 de agosto de 2012

Amor da minha vida...

 
 
 
Ontem subi ao topo do mundo.
Subi e tirei uma fotografia aos outros pequenos arranha-céus que por ali abundam e também às luzinhas do chão.

Não consegui ficar lá… nela… porque isto de subir ao topo, tem destas coisas.


Mas parei, parei e sentei-me no chão, a tentar ver o caminho que me trouxe até cá…

E lembrei-me, lembrei-me que nunca te esqueço, que te vejo em todas as pequenas coisitas que olho,
Lembrei-me dos meses seguidos que dormiste ao meu colo,
Das nossas brincadeiras malucas,
Das nossas viagens,
Das nossas Disneys, óperas e bailados,
Dos nossos fins-de-semana a ver filmes e a comer pizzas…

Lembrei-me do teu sorriso aberto e fácil,
Das tuas gargalhadas apaixonantes, irresistíveis…
Das tuas outras gargalhadas, só nossas, quando te como a barriga pelas manhãs…

Lembrei-me dos teus passos enquanto danças pelo ar,
Dos raios de felicidade, oriundos do teu olhar, sorriso e alma,
E que nos atingem como dardos certeiros…

Lembrei-me dos nossos chapinares horas a fio na água salgada…
Lembrei-me do teu amor infinito, sem fronteiras…

Como eu era feliz... como eu o era sem saber caramba…

Obrigado.
Obrigado por teres feito de mim uma pessoa melhor.
Obrigado por fazeres com que eu tente ser uma pessoa melhor.


E agora vou continuar por aí,
Por esse mundo imenso,
“vergado”por esse teu amor que carrego,
Por esse amor puro que me ensinaste e ofereces a cada micro-segundo que sou…

Vou continuar porque
Ainda temos um mundo por descobrir… e um milhão de aventuras por colorir…
(por um "Desconhecido" que não quer ser conhecido...
para a filha que traz no coração)

e que eu como mãe resolvi partilhar porque sei o que é amar assim incondicionalmente... porque também o meu é o amor da minha vida... porque ele também faz de mim uma pessoa melhor...
dedico-o a todos os pais... todos os filhos... todos os que amam incondicionalmente.


Isabel Reis

Alcofa de tantas virtudes



Acolhe-me no teu regaço
sustento da minha energia
reserva-me o teu espaço
preâmbulo de fantasia

rosário de lindas flores
de fragrâncias celestiais
cesteiro de múltiplas cores
que jamais se verão iguais

magia simples então nasceu
num humilde berço divinal
onde foi eleito o plebeu

foram condimentos dalgum sal
onde um prato enriqueceu
um amor singelo e real

 

António MR Martins

Assim Nasce Um Poema

 
 
 
No sangue
entranha-se um poema
Percorre as veias do sentimento
Solta plaquetas de amor
partilhadas no coração sofredor
Pequenas moléculas elevam-se
no cérebro já esquecido
no tempo perdido
da vida que passou

Mas,
nesse sangue que corre
e percorre
o corpo já findo
As palavras já fracas
fluem
soltam-se
E,
nasce um poema!


Maria Antonieta Oliveira

Evidente tristeza

 
Aviário de Hong Kong, by Gonçalo Lobo Pinheiro.
 
Contrastando com o poema uma imagem da perfeita regulamentação da natureza, num belo episódio.
 
 

Entornado
O desencanto
No aprumo
Do movimento

Desse mantimento
Não janto
Por maior que seja
O sofrimento

Rastejam
As maldições
Na réstia da gula
Sofrida em volta da mesa

Dificultando
As digestões
Do alimento
Da firmeza

Não há volta a dar

Os próximos tempos são de tristeza

 

António MR Martins

sábado, 25 de agosto de 2012

Regresso

 
 
 
Deslizo nos caminhos de então
e vejo os mesmos céus tremendos
minha alma plena de remendos
cabe inteira na tua solidão

De tanto andar me torno terra
De tanto me perder me reinvento
arma e pedra
pó e tormento

De tanto te amar me guardo nos teus olhos
prata e luz em que se espelham
cinzentos
os dias desta mágoa em que me afundo

Edgardo Xavier

Terras perdidas no tempo

 
Carvalhal-Miúdo, freguesia e concelho de Góis. Uma aldeia perdida no tempo, vazia do calor humano e dos consequentes campos amanhados. Um lugar especial para quem usufruiu da sua observação, do calcorrear dos seus trilhos e da profundeza da paisagem que a rodeia e alinha. Um pedaço de sentimentos que não tem medida. O gostar-se tanto que chega a parecer tão pouco. O querer permanecer e, simultaneamente, fugir. Um gostar que dói, demais!...
 
 
Lugar de fetos e silvados
Estes saudosos campos
Onde descansa
O clamor de tanta vivência
 
Terra outrora abraçada
Pelo anseio
De se receber o epílogo
Das sementes em si lançadas
 
Nestes campos                                                
Num tempo remoto
Verdejantes
Onde nas horas perdidas
Subsistiu tanta esperança
 
Imagem esquecida
No contraste dum tempo
De uma beleza sentida
Ante o esfumar
De tanta bravura
 
António MR Martins

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

ANTI-MANIFESTO

 
 
 
Quando tudo parece no fim
e alguém se levanta

mesmo que seja
num simples gesto

a dizer não
a dizer basta

cortam-lhe as mãos
cortam-lhe a garganta
 
 
Joaquim Alves

Tenho-te em mim

 
 
 

Tenho-te em mim
no aconchego do sentir
na avidez de te querer
na suavidade do sorrir
na felicidade de te ver

Tenho-te em mim
ao raiar do amanhecer
no preparar para partir
no chegar ao anoitecer
para junto de ti dormir

Tenho-te em mim
da alegria à tristeza
estalar do nervosismo
no sentido da beleza
e em tudo o que cismo

Tenho-te em mim
naquilo que representas
pelo filho que é nosso
pela força com que tentas
colmatar o que não posso

Tenho-te em mim
na vida a qualquer hora
no sol que nos ilumina
na espera que demora
em tudo que nos domina

Tenho-te em mim
de qualquer forma ou jeito
distante ou nos meus braços
no encostar ao teu peito
ou vendo teus belos traços

Tenho-te em mim
por aqui ao fim do mundo
entre o dia ou noite fora
por um beijo mais profundo
ou num afago que cora

Tenho-te
da maneira mais singela
quando te revejo assim
plena da minha janela
por onde te tenho em mim

 

António MR Martins


terça-feira, 21 de agosto de 2012

QUERIA SORRIR




.
Eu gosto de sorrir, se a alma sente,
ou o coração ordena... e soam gargalhadas,
mas, é breve o riso, expira amargamente
a ver ao meu redor tanta gente desgraçada.
.
Olho para o céu e vejo a lua,
a esboçar um sorriso delicado,
que abrilhanta as pedras lá da rua,
ou talvez, algum par de namorados...
.
Mas o mundo é deveras traiçoeiro
e faz expirar o meu sorriso, já esboçado,
depressa me convenço que sorrir,
.
de formas descuidadas e sem jeitos,
só é possível, p´ra quem na vida não sentir,
a amargura que existe, noutros peitos.
.
Lita Lisboa

O puto



GLP, 23 meses


Sei de ver um puto assim
nascido da minha gente
que tanto chamou por mim
em anseios de pingente

sei do crescer envolvido
pelos traços de sua vida
do muito tempo sofrido
entre chegada e partida

sei de muitas velhas questões
cobradas a qualquer hora
quando ventilei sermões
vindos da boca p’ra fora

sei da sua vida escolar
e do trabalho primeiro
da sua veia de namorar
com seu olhar sorrateiro

sei tanto desta criança
e mesmo tanto nunca sei
eis que a vida avança
e muito ou  nada direi

sei de tanta amargura
de alegrias supremas
com abraços de ternura
mais uns quantos dilemas

sei do sentido maior
que define este puto
e sei mais ainda de cor
do seu meditar astuto

sei que lhe desejo tanto
na procura do seu trilho
pois a este puto encanto
me digno chamar de filho


António MR Martins

Num outro lugar as balas por rosas...





Desceu da montanha a nuvem
de poeira
com cheiro a pólvora queimada

Abriram-se poços de silêncios
angustiados

No terror das balas perdidas
e nos gritos
de medo e dor,

a fome
a míngua
a lágrima
o pão mal repartido por mil bocas
famintas

Busca-se o amor
que aos poucos também se extingue…

Já não há flores nem auréolas
de luz…
apenas o dissabor de ver
extintas
místicas aspirações


Alvaro Giesta

in "há o silêncio em volta" (para breve), edições Vieira da Silva

A razão das fontes do meu caminho



Pelos rumos onde inventei
os anos da minha origem
nunca por tanto assim cismei
no sentido duma vertigem

a secura me atormentou
nalguns trechos da existência
noutros pedaços se festejou
a riqueza da permanência

caminhada encorajada
em rubores de imprecisão
meras ilações cativantes

brota a água desejada
por entre fontes imensidão
e telheiros arrepiantes



António MR Martins

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Amantes




A noite condensa-se
Sobre a minha pele.
Entra, gota a gota,
Pelas veias adentro.
...

Borboletas noturnas
Oferecem as asas,
Sem vento,
Às velas dos moinhos.

A meia-lua navega no rio
De águas paradas,
À mistura com cisnes
E destroços de poemas.

O gume do machado
Ainda cheira ao sândalo
Do teu corpo de névoa.

A lava de um vulcão
Acende o horizonte,
Incendeia-me de desejo.

Os profetas dos dias
Costumam beber dessa luz
No chão, ferido pelo fogo…


Lurdes Breda

Raiz sentida


Não quererei lapidar
os teus sorrisos.

Longe de mim
transformar os teus olhares.

Tudo em ti
assume um valor intrínseco.

Nada mais passa
de um sentir supremo,
no representar máximo
de um simples sentimento!...

O de te amar!



António MR Martins

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

O amor diz-se no silêncio



Amo em silêncio,
Quando os corpos insinuam
Gestos quentes,
Revoltosos...
Como as ondas na praia deserta
Elevando os delírios.
Amo em silêncio,
Quando as sombras se escondem,
No melancólico despertar,
Assim a minha alma suspira
Nos beijos que aquecem as manhãs.
Amo em silêncio,
Quando o abraço acalma o meu peito,
E as palmas das mãos se encontram no vazio
Velando meigas e serenas
Na calma extática que afaga o meu coração.
Amo em silêncio,
Sem palavras inteiras,
Encontrando todos os lugares perdidos,
O colo é o porto de abrigo
A brisa solta-se da enseada do teu dorso
Onde velejo sem rumo.
Amo em silêncio,
Imaginando o teu rosto,
Deslizando o meu toque cerrado
Numa entrega imperial...
Adormeço assim na nascente inerente a ti
Para escutar apenas e tão só
O doce sabor da tua voz.

Luís Ferreira

in livro "O céu também tem degraus", páginas 60 e 61, edições Esfera do Caos Editores, 2011

Alto enredo



Os lábios se descolam dos seus
De uma forma tão delirante
Os dele tornam a colar aos seus
Quando já lhes diziam adeus
Perante desejo palpitante

Assim se encostam os narizes
Entre as ondas da sofreguidão
Revigorando pelas raízes
Sonho colorido de matizes
Empolgadas pelo coração

Adiante gestos de afeição
No abraçar sem quaisquer limites
Lufadas de plena imensidão
Sem se questionar por contenção
Por onde salpicam apetites

Envoltos de alegria e dor
Apetrechos da massa humana
Exultando ao máximo valor
A que damos o nome de amor
Ante rubor que dela emana

Revolvem-se os plenos sentidos
Naquele cenário de afagos
Entre os corpos tão perdidos
Não escutando outros pruridos
Senão os seus arfares tão vagos

Culmina o sensual enredo
Perante as estrelas cadentes
Que germinam de tamanho medo
Escondido no rico vinhedo
Nos resquícios adjacentes


António MR Martins

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Presença...


Na imperfeição que me rege
Quero-te
Com a clarividência dos deuses
Com a suavidade das almas
Que sobrevoam às vezes
Estas planícies do sul

O meu vício és tu
Meu aconchego na noite
Meu alimento e jejum
Só peço a deus que pernoite
Esta presença constante
E que a certeza se afoite

A ir sempre mais longe
Num desbravar paralelo
O meu vício és tu
Que seja sempre singelo
Este aspirar igualável
Aos grandes lagos do sul
Minha firmeza imutável

Quero-te
Com este crer que elege
O teu abraço apertado
O manto que protege
O meu corpo cansado.


Antónia Ruivo


sobras de (in)conformação



sobra-me
o verso do entendimento
para discernir o poema
na fonte de inspiração

as palavras se revolvem
saltitando
como bolas em tômbola
de euromilhões ou totoloto

tanto falta e tanto sobra
sem sentido e sem rigor
entre carências e abundâncias

este poema está desgastado e amorfo
o verso já não faz sentido

a palavra
a essa deixaram de lhe dar o devido valor



António MR Martins

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Bravura


De que serve a brisa suave da noite,
Ou o cante melódico dos grilos,
Quando as madrugadas
Se tornam enormes,
...
E os dias nunca mais acabam!
Mas as memórias, essas,
Começam a crescer.

É preciso coragem!
É preciso coragem para envelhecer,
Quando a Alma
Não sabe os anos que tem,
E o corpo se cansa de viver sozinho…

É preciso coragem
Para calcorrear o Caminho,
Quando constantemente,
Se travam batalhas dentro de nós,
E mil milhões de soldados
Se digladiam a sós…
Entre a Luz,
As brumas, e o destino!

É preciso coragem
Para Caminhar sozinho,
Passo a passo…
Bem devagarinho!

José Dimas

Quando as palavras envolvem



Pelos lábios do seu encanto
se aprimoram tantos clamores
que já não elevam mais espanto
entre os efeitos sonhadores

trinam-se melodias mais raras
duma beleza inconfundível
revendo-se expressões nas caras
entre o vislumbrar invisível

como entoam outros pruridos
perante olhares consentidos
por onde enreda a perfeição

mexem-se valores e sentidos
significados dos mais batidos
que empolgam qualquer coração


António MR Martins

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

poesia



nasce o poema
desabrocha a rosa
árida a terra
mas a fonte brota
nasce o poema
a chuva lava o pó
sem poesia não chove
o rio não corre
o mar mete dó
nasce o poema
ninguém está só


António Paiva

in livro "Janela do Pensamento", pág. 46, Edições Ecopy, 2007 


pela verdade e pela honra



não se tem confiança
na trapaça
e na incoerência do ser

não se vendam ilusões
nem tampouco se comprem
as vendas das mesmas.

a coesão do íntegro
é o rigor da verticalidade

assim
se devem assumir
os verdadeiros


António MR Martins