sexta-feira, 30 de setembro de 2011

RECEITA


Quando se quer morrer,
basta apenas matar-se,
pode ser num hotel,
pode ser num rio,
pode ser com veneno,
pode ser com um tiro,

ou pode ser assim aos poucos

como faço eu em meu suicídio
de todos os dias,
a cada minuto, a cada hora,
um pouco de cada vez,

mas é sempre preciso
começar a morrer
matando primeiro
os sonhos:

depois a morte virá
sem que se perceba.


Álvaro Alves de Faria

in livro "Três Sentimentos em Idanha e Outros Poemas Portugueses", página 86, edições Temas Originais

Poema em P


Podem prender
Publicamente
Pessoas pobres
Pedintes
Poetas pensadores
Penitentes perdedores
Plagiadores

Podem prender
Passivamente
Participantes
Palermas perdidos
Pecadores poluídos
Pendentes prometidos
Perseguidores

Podem prender
Paralelamente
Por propostas pracianos
Patifarias propinas
Péssimas polémicas
Povo pela plena poeira
Palradores
Podem prender
Plenamente
Penhoras perfeitas
Práticas percalços
Paz polvilhada
Pelo pavor paleio prepotente
Penhores

Podem
Pedem
Pensam
Pintam

Políticos podem prender

Pelo país por prometer
Pelas pantanas por perceber
Pelos pomposos protocolos
Pálidas pontes pistas pólos
Pragas potentes poluentes
Pilhando pistolas para pacientes


António MR Martins

imagem da net

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Louca sabedoria


Louca sabedoria
incrementada pela voz
desse dom
que é saber comunicar

saber viver melhor
sem a dor de andar perdido

louca sabedoria!

Saber olhar o nosso sentir
saber tocar nesse desejo entranhado
com um afável sorriso
e no gesto sucumbir à tentação

louca sabedoria
de saber galantear cada dia.


Paulo Afonso Ramos

traço do recomeço


qual cavalo de água
ou de tróia na palavra
onde os segredos permanecem
quietos na sua inquietude

qual eclodir inesperado
onde o silêncio se corta
e emergem as intenções
guardadas em cada imo

o gesto é o recomeço
a cada nova jornada


António MR Martins

imagem da net

domingo, 25 de setembro de 2011

Amar-te em silêncio




Deixa-me amar-te assim... em silêncio...
Não me peças palavras que não sei pronunciar, nem gestos que nunca fiz. Não sei tanto do que queria e quero tanto do que não sei.
Olhas-me e perco o norte. Fico muda e desvio o olhar. Não é por não te amar, mas sim por esse amor ser grande demais. Mas em silêncio...
Seria tão fácil dizer que te amo e perder-te. Seria tão simples dançar ao som da ilusão e entregar-me completa, plácida, serena, e acrescentar apenas as letras que faltam quando não digo “Amo-te”!
Não me peças para ser o que não sou, nem para me transformar subitamente em mulher, porque sou apenas menina.
Queria crescer nos teus braços fortes e esconder-me atrás do teu tronco másculo. Mas abraço-te... em silêncio.
Desejo o suave toque acetinado dos teus lábios nos meus e imagino como será um beijo de verdade. Anseio por ele e sonho-o.. em silêncio.
Aproveito-me do que tenho de melhor e sonho... Nos meus sonhos eu sou tua e tu... Tu, meu amor, pertences-me! Todos os dias nos amamos intensamente e somos apenas um do outro! Todos os segundos das minhas noites são aproveitados ao máximo e vividos energicamente, ardentemente, gloriosamente...
Chega a manhã e a realidade!
Não me peças palavras que não sei dizer e deixa-me! Deixa-me amar-te assim... em silêncio...


Vera Sousa Silva

foto da autora, by Lua de Marfim

entre o destino e a sorte



a cada relinchar do cavalo perdido
o eco na montanha adormecida

e as árvores escutam o som
do caminhar sorrateiro das nuvens
entre as palavras perdidas
do verso por inventar
e que o tempo não ousa encontrar

há um canto amargurado
na ida e volta
por entre os trilhos da desventura

e a efémera sorte
não é para quem a procura
mas para quem a tem por desígnio


António MR Martins

imagem da net

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

FRAGMENTOS DE MIM - CEPTICISMO


Travo um diálogo com a vida,
e fico num cepticismo,
porque se nego as verdades,
estou cometendo ilogismo.
E num dificil colóquio,
entre o céu e este inferno,
tento ser medianeira
de tanta contradição.
Ouço a voz do absurdo,
vaticinando o futuro,
sem qualquer motivação.
E a alma fica gelada,
com o frio da madrugada,
lutando pela razão,
querendo acordar o tempo,
dizer que é o momento,
que é preciso renovar...
Mas é tanta a letargia,
em estado de hibernação,
onde prima a insapiência,
que vou perdendo a ilusão.


Lita Lisboa

Há caminhos por percorrer


Tonificado sentir
entre a seiva da poesia
se empolga a cada hora
desgastando sorrateiro
o sofrimento atroz
e as vestes do silêncio
onde desabam os sentidos
pela infinidade dos tempos

Apaladada sedução
de intercâmbio empolgante
se mistifica a rigor
sem vestígios contemplativos
no socalco generoso
que culmina no esplendor
entre o norte da esperança
e o sul da liberdade

Desvanecem-se preconceitos
em partículas de fulgor
traços de outros desenhos
ou empenhos figurados
na mostra do encantamento
ficcionado ou inventado
pelas ruas mutiladas
quase todas sem saída

Ressurge a perfeição
telepatia sem ter apelo
que inteira sensações
entre outros conteúdos
na espera de um abraço
ou num aperto de mão
que no gosto de outro espaço
intensifica tanto amor

Entre os filtros já rareia
o prazo da comoção
e de tantas emoções
que jamais retornam à tona
nos rios do desespero
mas revoltas essas águas
se libertam sem ter medo
exultando tanta esperança

António MR Martins

foto da net

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Belo anjo


Quando, em vias de perder a esperança
um anjo, vindo do céu, caiu a meus pés
lançou-me um feitiço, um olhar de viés
penetrou-me com sageza e perseverança


deixou cravada no meu peito a sua lança
e encharcou-me com água de mil marés
logo meu coração ganhou força de dez
e se encantou pelo seu jeito de criança


eu sei, belo anjo, qual a tua motivação
sei também que fazes tudo sem alarde
e sou o alvo desse teu afecto e fervor


se bem conheço o meu pobre coração
garanto que mais cedo ou mais tarde
por ti, belo anjo, se inundará de amor


Emanuel Lomelino

1.


Esvoaçam os fúlgidos cabelos
Entre as arestas do templo
Nos descaminhos da fortuna

Resta a centelha da amargura
Ou a espera que não se consome

Na haste da ilusão
Se galgam as sentenças
Entre o sacrário das descobertas

António MR Martins

foto de Gonçalo Lobo Pinheiro - Ruínas de S. Paulo, Macau

sábado, 17 de setembro de 2011

Enlevo



O teu rosto, amor,
É canela, açafrão,
Ternura aberta em flor,
Em pétalas de paixão.
O teu rosto, amor,
Tem luar de felicidade,
Sorriso d’esplendor,
Num poema d’amizade.
O teu rosto, amor,
É pátria, coração,
Pássaro livre, sem dor,
Num céu de compreensão.

Lurdes Breda

3.


No jogo a sorte da vida
Ou o azar de tanta miséria
No colorido de cada fonte


A luz permanece resplandecente
Com um brilho jubilar e contínuo


Todo o resto passa adiante


António MR Martins

foto de Gonçalo Lobo Pinheiro - Casino Lisboa, em Macau

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

BRISA


Deixa-me ficar contigo um pouco mais
Pelo menos enquanto sopra essa brisa
E tua mão que pelo meu pescoço desliza
Excitando-me, transmitindo carinho e paz

Não! Não quero ir agora
É noite, a madrugada logo estará aí
Abraça-me! Sinto que não devo sair
Está frio, chove muito lá fora

Compartilha comigo o teu leito
Agasalha-me junto a teu peito
Viver essa paixão é o que mais desejamos!

Assim, quando o dia surgir
No auge do amor, com certeza ouvirei de ti
Fica um pouco mais, é cedo ainda, te amo!


Walter Pereira Pimentel

2.



No extermínio da solidão
Se restabelecem os sentidos

Outra plataforma do entendimento

Há quem se submeta à palavra
Pelas ordens recebidas
Sem discussão


António MR Martins

foto de Gonçalo Lobo Pinheiro - Largo do Senado, em Macau

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Poema a Poços de Caldas


Cidade linda abraçada pela Serra
Circundada de plantas multicores
Que quando chora o céu, perfumada a terra
Ou escreve poemas na Fonte dos Amores
Na bagagem trouxe a mais pura amizade
Que alimenta como pão de cada dia
Porque só ela traz a maior felicidade
E veste a alma com cores da Poesia
Poços de Caldas, que bom foi conhecer-te!
Jamais meu coração irá esquecer-te
Os teus recantos são de beleza natural
Eu prometo voltar... só não sei quando
Mas em todos os lugares vou deixando
O meu abraço em nome de Portugal


Alexandrina Pereira

O mar de tantos (des)encantos



E o mar não tinha braços
nem ondulação hostil,
entre as vértebras do descanso,
num amainar assaz profundo.

Acariciava as rochas,
que pendiam das escarpadas,
por entre o sorridente raiar
da luz do sol que despontava.

E nas grutas das memórias
então ele se espraiava
numa sensualidade suprema
e no aconchego da sua paz.

Esse mar também bravio
que ultimou tanto destino
onde feneceram existências,
tem por ora a plena virtude
de meigamente se encostar
à doce orla que o acolhe.

E o voo das aves festeja-o
numa alegria sem limites.


António MR Martins

imagem da net (dreamstime.com)

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Desinferno II


Caísse a montanha e do oiro o brilho
O meigo jardim abolisse a flor
A mãe desmoesse as carnes do filho
Por botão de vídeo se fizesse amor

O livro morresse, a obra parasse
Soasse a granizo o que era alegria
A porta do ar se calafetasse
Que eu de amor apenas ressuscitaria

Luiza Neto Jorge, in “Poesia”

Natal pode ser quando um homem quiser, às vezes nunca


Noite radiosa de Natal
alpendre de pura magia,
entre abraço sem ter igual
a um ser que muito sofria.

Noite de especial carinho
de afago ou de presente,
apego de fé num santinho
numa visita a doente.

Brilha o céu bem estrelado
se não chover por essa hora,
um coração despedaçado…

Clamor de um desalinhado
que às vezes perde e chora
ao sentir-se injustiçado.


António MR Martins

imagem da net

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Voz Que Escuta




Chamam-me lá em baixo.
São as coisas que não puderam decorar-me:
As que ficaram a mirar-me longamente
E não acreditaram;
As que sem coração, no relâmpago do grito,
Não puderam colher-me.
Chamam-me lá em baixo,
Quase ao nível do mar, quase à beira do mar,
Onde a multidão formiga
Sem saber nadar.
Chamam-me lá em baixo
Onde tudo é vigoroso e opaco pelo dia adiante
E transparente e desgraçado e vil
Quando a noite vem, criança distraída,
Que debilmente apaga os traços brancos
Deste quadro negro - a Vida.
Chamam-me lá em baixo:
Voz de coisas, voz de luta.
É uma voz que estala e mansamente cala
E me escuta.

Políbio Gomes dos Santos

À porta da esperança ou simples utopia

À porta da transição
Onde o acordo compete
E o diálogo só vale
No sentido da razão
Se entenderam conceitos
E se deu valorização
A toda a nobreza humana
Como esteio da concertação

À porta da redescoberta
Onde nada mais se ensaia
Se entra com prontidão
Desde que a intenção não moleste
A grandeza da sedução
Na apoteose do carinho
E de outra congeminação
Entre o amor que a todos reste

À porta de elevação
Não se tramam mais atitudes
Em recreios de malvadez
Que fomentem o descrédito
Denegrindo semelhantes
Em tantas vicissitudes
Depauperadas nos tempos
Que tingiram tantas imagens

À porta que nos desperta
Começa um mundo novo
Onde nos espera a alegria
Numa intensa melodia
Fortalecendo o âmago
De tanta mente caída
Pelo superar das dificuldades
Com perseverança e magia


António MR Martins

imagem da net.

domingo, 11 de setembro de 2011

enclausurado


revelei-me precipitado.
a porta estava aberta ao mistério do coração.
amontoei os pedaços do meu corpo, vazio,
junto com o silêncio da noite.
senti-me enclausurado, perdido,
evocando na escuridão a tua boca.
nela quero morrer enquanto o vento leva os versos do poema.


Gonçalo Lobo Pinheiro

Quietude final

O momento é de silêncio
Na estrada do sem fim
Onde o desagrado ultima
A consternação emergente
Do sentido já morto
E sem memória retida

O atalho já não serve
Para uma utilização certa
De um destino aproximado
No tempo que não demora
Na exaustão de cada hora
E da mensagem proscrita

A nuvem já não existe
No desfiladeiro estrelar
E na insónia da paisagem
Esquecida no lamento
Onde despontou a vileza
De toda a consumação

Os clamores terminaram
Na pressão permitida
Que restaura ambiguidade
E desfere imposições
Sem sentido profícuo
E valor sensorial

O sentir já não mora
No contexto da vida
Ou de qualquer existência
Então nada mais fenece
E outra origem prevalece
Numa morte permitida


António MR Martins

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

MI CORAZÓN Y LA GUERRA


Si acaso un día me buscas,
te esperaré en crepúsculos de tarde.
No me hallarás en guerras
ni en fríos soportales.
Porque mi corazón no se detiene
en amargos pantanales,
él vive y se baña
en lunas y azules soles,
vuela como paloma
en campos y verdes valles,
le da a la flor sonrisa
y a la gaviota mares.
Que la vida y el amor no pare,
que en mi casa entre luz y aire,
alejarme de la crueldad quiero,
reniego de las maldades.
Mi puerta sólo está abierta
a poesia, sol y aire,
a los labios de un amante,
a su beso...
y al amor de ese instante.


Angie Ibarra, de Barcelona

reintegração especial


em cerimónia tão cáustica
onde as luzes foram ribalta
não se enquadram reboliços

não há espera que amanheça
nem paradeiro simulado
entre as desventuras da sorte
que aprofundam sentenças
retidas e conservadas

os foguetes se dissipam
nos céus da concepção
onde nascerá a luz plena

um parecer magnânimo
resulta de toda a terra
lavrada pela virtude
como semente revolta
que incorpora todo o sentido

um flash é a promessa
que destempera o desânimo
e logo atraca no esplendor


António MR Martins

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Das Quatro Estações - O Outono


Novembro apagou nas buganvílias
seus nomes brancos, roxos, escarlates.

É mais difícil regressar a casa:
o caminho disfarçou, emudeceu
seu rosto nos muros e nas grades.

— Por onde seguiremos
sem que o outono espesso nos trespasse?

José Bento

In "Um Sossegado Silêncio", Porto, Edições Asa, 2002

Quem pode manda e quem manda pode


Encurralados no efeito
e no espaço circundante,
se encaram pelo defeito
em sentido alienante.

Negam expedir quaisquer sons
pelas bocas da sua presença,
por eles não sobressaem dons
nem aguardam por sentença.

Ninguém ousa assim opinar
pela decisão ultimada,
sem direito a reclamação.

O desfecho é de esperar
pela solução encontrada
e espera a revogação.


António MR Martins