quinta-feira, 27 de junho de 2019

Samarone Lima


Samarone Lima, imagem da net.





O CAFÉ DO DESTINO


para Zeneuda

Nunca esquecerei o dia
em que minha avó fechou a porta da casa
para ir à missa.

Eu estava em seus braços, creio
e ela percebeu
a mancha de café
na ponta do vestido.

Minha avó abriu a porta
me deixou quieto num canto
e lavou a ponta do vestido
que voltou a ficar totalmente branco
(ou azul, não lembro).

Minha avó ligou o ferro
para passar na ponta do vestido
quando levou o choque
que lhe quebrou o braço.

Não teve missa, não teve mais nada.

Minha avó foi minha mãe
durante um ano.

Até que o café pingou
na ponta do seu vestido
na ponta do destino
e fui viver outra vida.

Samarone Lima, in “O Aquário Desenterrado”, páginas 40 e 41, edições Confraria do Vento, Rio de Janeiro, 2013.
  

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