quinta-feira, 15 de novembro de 2012

33 [Há um bicho ferido nos teus gestos]

 

Há um bicho ferido nos teus gestos
deslizante como um segredo na noite.
Há um silêncio de bronze que se
desfolha e se desdobra louco na tua
pele a erguer-se como uma febre.
E em mim fica suspensa a furiosa
e dorida lágrima e o riso é-me
um lago de raiva sinal trovejante
no mar interior da minha esperança.
As palavras voam-te e são coisas
de vidro estilhaçadas que ferem de
vez em quando e a lucidez
tremula-te nos olhos sérios e o teu
riso é uma perdida infância
um incêndio longínquo.
Resta então a paisagem triste
da minha presença alucinada
que sangra cansaços e uma flor
de mágoas rebenta-me nos lábios
solitários e frios lentamente
pela madrugada...

Airam Alice Pereira Santos

in livro "Stasis" (edição póstuma), nas páginas 71 e 72, edições Temas Originais, Coimbra, 2012.

2 comentários:

jorge vicente disse...

Magnífico!!!

Vou comprar!

Muitos abraços
Jorge

Teresa Teixeira disse...

Tocou-me profundamente, este texto, porque o "vivi". Estranha e dolorosamente familiar, este dizer de vida... Mais que talento, sinto aqui Dor. Sinto.