domingo, 13 de agosto de 2017

António Duarte Mil-Homens


António Duarte Mil-Homens, imagem da net.



Poema que alguém não escreveu

Não me consolem!
Não me confortem!
Não me adormeçam o ódio!
Deixem-me soltá-lo e bebê-lo!
Quero respirá-lo e sê-lo!
Quero programá-lo e dizê-lo!
Não mo apaguem!
Não mo corrijam!
Não o estanquem!
Deixem correr…
Quero espalhá-lo ao escrevê-lo,
e para o escrever preciso tê-lo.
Quero fazer dele o ébola
em que cada um de vós,
ao lê-lo, sinta incubar,
virulenta, a indignação,
o medo, o horror,
quiçá a admiração,
o pasmo, a revolta…
mas não o sono, a indiferença.
Que seja a cura ou a doença,
jamais o mono, o forra estantes,
o objecto decorativo.
Figurativo, nunca! Antes abjecto!
Quero que o tenham à perna,
vingador e vingativo
dum passado que vomito,
que exorciso quando escrito.
Que não se afoga no tinto.
Que não se dilui quando o pinto,
disforme e feio.
Que não se cala quando o grito!
Que não me importa se o minto,
se assim o sinto…e ODEIO!!


António Duarte Mil-Homens, in “Voda ou Morte duma Esperança anunciada”, páginas 61 e 62, Edição de Autor, Macau, Setembro de 2010.    

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