quinta-feira, 1 de março de 2018

Carlos Morais José



Carlos Morais José, imagem da net.





António Ramos Rosa Avenida Ouvidor Arriaga

há algum tempo que o
meu olho esquerdo me vigia

sonho-o acordado enquanto durmo, mas não
para me proteger das sombras, no meu quarto,
ou de quem durante a noite se senta na
cadeira vazia e me relata as horas

vigia-me, o cabrão, com o
despautério próprio dos olhos, a
sanha agreste de um malvado
albergo um agente
secreto na face: fareja um jogo duplo…
sempre que solicitado

e quando acordo, às horas a que o
mundo deveria confortar-se de doce e
banal normalidade, são a
perna e o braço que fraquejam, a lateralidade e o
bocejo, o horror das coisas repartidas
pobres vidas que antevejo

certos os antolhos pendurados dos sobrolhos e
uma fatiga de cílios, de pupilas, de lençóis a
secar na morrinha crepuscular e
disse ainda:

- o lado esquerdo, luar…

Carlos Morais José, in “Visitações”, páginas 19 e 20, edições COD, Macau, Novembro de 2013.

Sem comentários: