Mário de Andrade (1893-1945), imagem da net.
O REBANHO
Oh! minhas alucinações!
Vis os deputados, chapéus altos,
sob o pálio vesperal, feito de mangas-rosas,
saírem de mãos dadas do Congresso…
Como um possesso num acesso em meus aplausos
aos salvadores do meu estado amado!...
Desciam, inteligentes, de mãos dadas,
entre o trepidar dos táxis vascolejantes,
a rua Marechal Deodoro…
Oh! minhas alucinações!
Como um possesso num acesso em meus aplausos
aos heróis do meu estado amado!...
E as esperanças de ver tudo salvo!
Duas mil reformas, três projetos…
Emigram os futuros noturnos…
E verde, verde, verde!...
Oh! minhas alucinações!
Mas os deputados, chapéus altos,
mudavam-se pouco a pouco em cabras!
Crescem-lhe os cornos, descem-lhes as barbinhas…
E vi que os chapéus altos do meu estado amado,
com os triângulos de madeira no pescoço,
nos verdes esperanças, sob as franjas de ouro da tarde,
se punham a pastar
rente do palácio do senhor presidente…
Oh! minhas alucinações!
Mário de Andrade (1893-1945), in “50 Poemas e um prefácio
interessantíssimo”, página 30, edições Nova Fronteira, 2012.
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