quarta-feira, 14 de abril de 2010

"Livro Imperfeito", de António Paiva (Excerto da obra)


“Se sofro de algum romantismo é pelo gozo de o sentir, não por queixume ou dor. Como todos os românticos, saboreio a delícia de me perder, num gozo de sofrimento por inteiro. Por isso escrevo, muitas vezes escrevo para além do que pensei escrever. Beneficio por isso, das carícias que as palavras me fazem na mente, enquanto me escorrem como néctar até à ponta dos dedos. Se entrego as páginas deste livro ao abstracto narrador, são várias as razões. De entre elas, o facto de saber que alma e sentir todos têm. Para além disso, a minha existência por si só não seria capaz de o escrever. Sempre assumi e reafirmo que a minha escrita é o plágio de muitas vidas de leitura.
Sempre que escrevo algo pela primeira vez fica-me algum sabor amargo, por ser a última vez que o escrevo pela primeira vez. Mesmo que aos olhos de muitos sejam frases despidas de sentido, são, pelo menos para mim, pensamentos fluidos, navegando em mar genuíno. Muitas vezes quando escrevo não resisto ao gosto de falar em mim, não é por uma questão de vaidade, mas sim por me facilitar o auto-conhecimento. Aprendi que é por aí o caminho para melhor conhecer os outros. Pode haver quem discorde, mas os gestos com que nos mostramos são em tudo semelhantes, até no modo como nos iludimos. Por dentro somos feitos dos mesmos desassossegos. Por fora somos gestos e roupagens. Um rosto.

A realidade pode perturbar o sonhador,
Mas o contrário não é menos verdade.”

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António Paiva

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António Paiva, quando o olhamos, olhos nos olhos, apercebemo-nos da grandiosidade do carácter de quem ali está, à nossa frente. Depois lemos o que escreve, seja poesia, seja prosa, e as suas palavras saboreamo-las com o maior dos prazeres. Há uma pura sensação de empatia com elas e com aquilo que nos contam.
António Paiva é uma referência, para mim e para muitos outros que o conhecem e àquilo que escreve, e é uma felicidade enorme poder contar com a sua amizade.
Este seu “Livro Imperfeito”, agora meu porque está aqui comigo, a meu lado, nesta secretária onde vou ordenando estas simples palavras, diz o autor que este livro é imperfeito, porque inacabado, dando ao leitor a possibilidade de o continuar escrevendo. Aí o valor intrínseco desta obra que nos leva a emocionar, a sugestionar e a imaginar outras nuances que possam ser correlacionadas com as do seu conteúdo, na perspectiva de o tornar infinito. António Paiva conta-nos coisas, seus sentires, suas passagens na vida e contrasta-nos suas ideias e experiências.
“ Livro Imperfeito” roça a perfeição no modo em que nos retrata lugares e situações que nos fazem sonhar. Ele também fala de Coimbra, mas de uma outra Coimbra por onde ele passou a sua juventude, mas é um dos muitos pólos de interesse deste livro, ora lançado, sob a chancela das Edições Ecopy, e que eu tive a oportunidade feliz de presenciar na sua apresentação, em Coimbra, no passado dia 11 (FNAC-Forum).
Por tudo o que referi, e por muito mais, e sobretudo por ser um livro da autoria do António Paiva, efectivamente, o recomendo.

António MR Martins


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