Sentei-me e quedei-me, sereno, meditando pelo
infinito. O burburinho centralizava a fixação auditiva enquanto a dor, também,
assolava alguns dos presentes. O espaço da capela ecoava os sentidos das vidas,
as passadas, as existentes e as vindouras, na roda efémera de todas as
vivências. As velas ambientavam os meios e quem chegava dirigia-se à urna, onde
o cadáver estava exposto aos olhares dos visitantes, e benzia-se depois de
salpicar de água benta o corpo moribundo, subtraído do espírito que, possivelmente,
observaria todos os passos que tendiam a homenagear o seu anterior corpo,
defunto. Perante tal desenrolar vão-se fazendo conversas. Uns falam mais alto
outros em tons mais baixos, quase segredados. Alguém comenta para outro, num
grupo de quatro ou cinco pessoas, “o
negócio é que vai de mal a pior…”. Do lado contrário outras expressões
acumulam o prurido na sala. Nestas ocasiões sempre se fala de tudo um pouco, e
às vezes de nada, de futebol, da política, dos colegas, da televisão, das
viagens e até do falecido: - Que boa
pessoa que era! São sempre os melhores que partem primeiro! Vai cá fazer muita
falta! Alguém que ouve comenta em surdina, para o seu companheiro de acesso
àquele local: - Olha que grande lata! Andava
sempre a dizer mal do morto, enquanto vivo, agora diz que era a melhor das
pessoas. Hipócrita! Todos sabemos que há um fim para tudo, só que tal se
diferencia apenas nos contextos.
segunda-feira, 31 de dezembro de 2012
A morte não tarda
25 - Lurdes Dias (Cleo)
São as sombras que se arrastam na noite escura…
A vida que não se vive
Enquanto a dos outros adormece…
São
as almas sem rumo
Que
se passeiam pelo infinitoDo deserto das suas vidas… perdidas…
Fruto
das escolhas malditas!...
Mais
uma noite
Mais
uma penitênciaMais um festejo de dor… sem amor…
E
lá vou eu pela rua
Absorto…
meio morto…Vou de encontro a abismos… esquecidos…
Acho
que me perdi no caminho
Não
sei o que faço aqui…Só sei que me perdi… de mim…
Avisto
a morte ali ao fundo
A
única certeza que me restaDesta vida que não tenho
Perdi
tudo… tudo…
Fiquei
sem nada… um farrapo de genteE ela não tarda…
in livro “ In Pulsos”,
página 35, edições Temas Originais, Coimbra, 2009.
domingo, 30 de dezembro de 2012
Rua da solidão
Kaiping (China), by Gonçalo Lobo Pinheiro
Na rua da solidão não há transeuntes acomodados
à troca de palavras, em viva voz, nem a resposta a uma pergunta por iniciar. Na
rua da solidão não há afagos nos rostos da presença, sem cumprimentos entre mãos
que não existem. Na rua da solidão não há abraços estruturados, nem preceitos
inacabados. Na rua da solidão as sombras são o desfile entre as luzes que a
acendem, no resfriar de cada noite. Ali não há o prurido nem o silêncio. Ali
não há a alegria nem tristeza. Ali não há nada a acontecer. Ali só se espera
que a solidão termine com a sua inacabada resistência.
IMAGEM REFLECTIDA
24 - Maria do Rosário Loures
mostra-me
o teu sorriso
ainda
hojecom dentes de leite
coloridos
mostra-me
os teus olhos
ainda
hojepela brisa do mar
salpicados
mostra-me
a tua alma
ainda
hojepela fresca geada
devorada
não
me mostres quem não és
para
poder por novos caminhosespinhos de rosa
chocolate amargo caminhar
in livro “Um
sumário da minha vida no século passado”, página 28, edições Edium Editores, S.
Mamede de Infesta, 2010.
sábado, 29 de dezembro de 2012
Quedado esperava o fim
Na surpresa da inoperância e sem qualquer
hipótese de dirimir ideias se restringiu à sua insignificância. Quase se sentiu
liquidado na vida sem incentivo para outros anseios e sem perspectivas de poder
exibir algumas das suas virtudes, que apesar de tanta incompreensão negativa,
realmente possuía. As ameias de todos os castelos a conquistar cada vez se
apresentavam mais altas, ultimando-se por inalcançáveis. Uma mescla de
sensações pulsava alertas para os dissabores que se perfilavam em catadupa.
Perante tantos factos nulos decidiu não avançar com mais ideias e projectos,
que ninguém ousaria aceitar. Apelou aos nadas que lhe rodeavam os pensamentos e
a conceitos irrelevantes se quedou, sem mais nem menos. Era o princípio do seu
fim.
NO DESERTO
23 - Maria Antonieta Oliveira
No
deserto árido e quente
me
perdi de ti.Em cada grão de areia
procurei teu rosto
Em cada pegada
procurei teus passos
No sol
quis ver teu olhar
quis ver tua boca
e teus lábios beijar.
Caminhei sem destino
perdida e sem caminho.
Já noite
chegou o luar
e eu já cansada
de tanto te procurar.
Larguei os sapatos
Despi-me de mim
Repousei o meu corpo
carente de ti
No deserto frio
tapei o meu rosto
Nem água tinha
para lavar o desgosto.
Maria Antonieta Oliveira
in livro “Encontro-me
nas palavras”, página 36, edições Temas Originais, Coimbra, 2012.
sexta-feira, 28 de dezembro de 2012
Questiúnculas
no
alpendre
onde
um exíguo estendal tanto estende
múltiplas farsas suspensas
se revelam
vão
oscilando
entre
prévias contradiçõesenraizadas de celeuma
(im)prováveis
quiçá
deploráveis
exibindo-se
em eixos de várias configurações
irremediavelmente
22 - João Carlos Esteves
Abri
as portas da ilusão
e
deixei-me por ela arrastarna esteira de um vento irreal
cruzando planícies dormentes
num sonho em gestação
Fui
sopro rebelde nos ventos
dancei
em montanhas douradase afaguei as folhas das árvores,
envolvidas por chuva outonal,
arrastadas nas águas tombadas
Imbuída
nas nuvens velozes
fui
lágrima perdida nos arespercorri distâncias sem nome
alcancei os limites dos mares
e verti-me em silêncio e em paz
Por
fim a ilusão esmorece
no
repousar do vento e das chuvasentrelaçada em memórias distantes
de momentos gravados nas cinzas
dos tempos tecidos nas brumas
in livro “ Absolvição”,
página 22, edições Temas Originais, Coimbra, 2011.
quinta-feira, 27 de dezembro de 2012
Presépio
"O Presépio", no lar.
Uma
luz brilhante nos traz
esperança
redentoraentre céu e campos de paz
nesta aura salvadora
correm
as águas das fontes
os
rebanhos nas pastagense na subida dos montes
se acolhem as paisagens
há
vida na grande aldeia
a
cada cantar do galona canção do novo hino
às
mentes vem a ideia
tanto
ou mais do que falojá (re)nasceu o Menino
domingo, 23 de dezembro de 2012
Feliz Natal de 2012 e Bom Ano de 2013.
Feliz Natal e Bom Ano de 2013 para todos os amigos, leitores e visitantes deste blogue, em geral, e suas estimadas famílias.
Meu abraço.
21 - Paulo Afonso Ramos
Silencio-te.
Noite triste
só
a lua me sorriplantada na escuridão
que aglomera a minha condição.
Silencio-te.
Sentimento impune
que
respira e sobrevive.Silencio-te. A razão que nos une
e assim afasto a voz.
Silencio-te.
Num silêncio cúmplice
silencio-te
e assim me deixo morrer!
in livro “Caminho da
Vontade”, página 28, edições Temas Originais, Coimbra, 2009.
sábado, 22 de dezembro de 2012
Um artigo sobre mim na edição nº. 5 da revista AKN online
António MR Martins no nº. 5 da revista, sobre a Arte e a Escrita, AKN online
Nas páginas 27, 28, 29, 30, 31 é publicado um artigo sobre a minha pessoa, como autor, onde se incluem alguns poemas meus.
http://issuu.com/akn-online/docs/akn_n_5_novembro_12?mode=window&backgroundColor=%23222222
Quando falam os corações
Nos passos perdidos onde o apressar dos
sentimentos estanca a ternura de cada rescender, se desacredita o sonho no
enfrentar do presságio da solidão e na ambiguidade exposta por cada estrela.
Resta o permanecente luar e a alteração do seu resplandecente brilhar por cada
sequencial noite. A firmeza do reencontro, nos caminhos que se cruzam a cada
esquina do olhar, se fortalece tenazmente. Há um sol que intensifica seus raios
em reflexos de luz sublime. Nada se mantém com o passado, mas o futuro é o
passo seguinte. Esqueçam-se os devaneios e faça-se justiça ao sentimento puro e
simples. Deixemos que a distância se aproxime de que cada ponto das suas
extremidades e, algures, toque o ânimo de cada eloquência. Eis o ponto fulcral
onde o amor fará falar os corações.
Como no primeiro dia
20 - Emanuel Lomelino
É
teu este coração rasgado
Que
o tempo não cicatriza.É tua esta alma penada
Que no meu corpo se refugia.
Estão em ti os meus pensamentos
Dolorosas lembranças de nada
A tua imagem é tudo o que me resta.
Esse último sorriso
Ingénuo de tristeza
Que na despedida me enviaste
Definha ao ritmo das minhas pulsações.
Esse último olhar
Terno de amargura
Que em mim pousaste
Esvai-se como suspiros.
O teu níveo rosto
Que, tarde na vida, aprendi a amar
Esbate-se da minha memória.
Mesmo assim
Não consigo deixar de te amar
Como no primeiro dia.
Emanuel Lomelino
in livro “Aprendiz de
Poeta”, página 43, edições Temas Originais, Coimbra, 2010.
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
Urge procurar o limite
Entre o barro de porte sereno, moldado da
vermelha e húmida terra, e as mãos que o tornaram objecto, se incrementou a
lágrima do esforço de tantas vidas. Entre esse modelar preciso, se desenhou o
sonho criativo de cada gerador de novos projectos. É como se confluíssem, em
reencontro de harmonia plena, múltiplas marés de todas as orlas marítimas, em
seduções de volumosa espuma de carícias. Ou como se todos estivessem imbuídos
na realização efectiva do mais belo dos sonhos, o da felicidade absoluta. Cada
criação torneia os obstáculos que possam afrontar o culminar dessa
concretização. A procura de nova fuga para um futuro melhor torna-se ávida e
urgente para que a mesma não se torne, cada vez, mais longínqua. E é preciso
que essa fuga tenha o respectivo retorno.
na ponta do cais
19 - António Paiva
é
muito mar
é
tanto maraos olhos das palavras
é diferente o sentido das coisas
estou
na ponta do cais
cala-me
a boca com um beijo
acalenta-me
este sonho vadiotão pouco
faz com que tanto valha a pena
estou
na ponta do cais
mar
do outro lado é longe
aqui
é tão perto mare tu mar
estás aqui e do outro lado também
estou
na ponta do cais
in livro “Janela do
Pensamento”, página 62, Edições Ecopy, Porto, 2007.
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Ilimitadas sensações
Nessa pele, remendada de
carícias amorfas, onde se enrugam as esperas consumadas. Nesse condimento
revelado pelas intenções omitidas em ânsias de tanta espera. Nesse subtil corpo
decorado pelo rubor de uma qualquer cereja, estendida na plenitude de toda a
contemplação. Nesses poros sequiosos, onde manobram as glândulas de toda a
exposta sensualidade em metamorfoses de movimentos inesperados, mas
determinantes. Nesse perjúrio revoltante cintila a luz de todo o fragor,
regurgitado pela adjacente exteriorização. Nesse todo clamam as fontes das
águas onde prima a clarificação do teu ser. Torna-se inebriante esse expoente
sem mácula e o sagaz efeito de tanto desejo. Há prazeres que as palavras não
conseguem justificar, nem sequer enunciar.
António MR Martins
[o corpo faz-se]
18 - Alvaro Giesta
o
corpo faz-se
de
fragmentos em união constante
tenta
o equilíbrio
a
harmoniaa força
membros
bocaa língua de sal
em frémito e movimento
o
que é fascínio contradiz-se
mas
seduz
tenta
relacionar-se sedento
por
criar um espaço que desfragmentaem desafios encontros e desencontros
in livro “Meditações
sobre a palavra”, um tributo a Ramos Rosa, o poeta do presente absoluto,
edições Temas Originais, Coimbra, 2012.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
Faleceu João Carlos Martins
Faleceu
hoje um grande homem da cultura, artista plástico, sobretudo aguarelista, mas
também poeta, um excelente poeta, João Carlos Martins. Há algum tempo doente,
mas sempre lúcido, decidiu publicar tudo aquilo que foi escrevendo no sentido
de o conseguir, ainda, em vida. Não foi possível, mas a obra em livro
acontecerá, tenho quase a certeza. Será algo de muito valor para quem ama a
língua portuguesa e gosta de poesia, em particular.
Um poeta
sintético, na sua explanação escrita, dizendo muito em poucas palavras, mas
sempre com uma beleza indescritível, como poucos o conseguirão fazer.
Fica aqui
a minha homenagem ao poeta, com a publicação de dois dos seus poemas, da sua
obra “Abismo de Palavras”, das páginas 20, 6. e 38, 24., uma edição Temas Originais, Coimbra, 2011.
6.
Alguém deixou à noite
luzes e vestígiosde quem terei sido:
Talvez os derradeiros
a depositar em mima dor e o prazer.
Por um instante assim
a tua voz abriuum sulco no meu ser.
Chego hoje à serra
para ser senhor e reide todo este granito.
Desde o início das coisas
só levo do que não seicarrego do que não sinto.
Levo mais água
no meu cansaçodo que cabe de silêncio
em cada grito.
João Carlos Martins
Alvorecer de virtudes
Alhandra, o Tejo, o Bando e o Horizonte, by António MR Martins.
Pela calada se esfuma o
silêncio de cada noite e o deserto de palavras que não surgem a preceito. Uma
mordaça incorpora todo o isolamento e as mãos não refrescam esse sentido. Nada
se expele por entre as amarras da desolação onde o auge se esquece, alheio a
todas as conformações. Nesse destempero sereno não permanece o sorriso e a
contraposição não assiste a qualquer necessidade. Os ouvidos sentem o ecoar
desse silêncio sem as barras de uma prisão consentida. Passa o tempo da
madrugada, onde os latidos de alguns seres caninos, em reclamação contínua,
resfriam a solidão rarefeita. Mais adiante, a claridade da nova manhã traz
consigo o renascer da esperança.
António MR Martins
17 - Diogo Godinho
meus dias.
Agarro-me à insónia, fiel companheira
de madrugadas em que me relembro
da tua dor, da dor da tua ausência,
da dor do meu pensamento, da dor
enferma, mesquinha, atroz.
A dor que a noite me trouxe entranhada
nas veias.
Deambulo por entre fileiras de copos;
mantos brancos, rostos brancos, pós brancos.
A cabeça estala, esfumam-se cinzas
em que te vejo partir, em que me
vejo partir.
A noite é vida, a vida é noite,
e o dia é nada.
Cumpro horas preventivas
pelo delito da nascença.
A dor agarrou-me
no seu estado indecifrável.
O amanhã é somente agora
e o hoje arrasta-se em ampulhetas
paradas.
Não há luz ao fim do túnel.
A madrugada amputou-me a dor
da razão.
A esperança apanhou a carruagem
da frente
deixou-me apeado na convulsa
nostalgia do presente e
só me esqueci de ti, quando a
tua dor se apartou da minha dor
e os meus olhos se fecharam
nas lágrimas dos teus.
Perdi-me.
Perdoa-me.
in livro “Estação
Terminal”, páginas 60 e 61, edições Temas Originais, Coimbra, 2011.
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
Longínquo estabelecer
um
pranto se esconde
nas margens do prazer,
há um sentir ileso
de toda a humilhação,
aí outro se consome
nas frestas da inquietude,
o balanço é o corolário
de todas as consequências
e o desnorte intensifica
a efervescência em ebulição,
por tanto tardar a acalmia.
nas margens do prazer,
há um sentir ileso
de toda a humilhação,
aí outro se consome
nas frestas da inquietude,
o balanço é o corolário
de todas as consequências
e o desnorte intensifica
a efervescência em ebulição,
por tanto tardar a acalmia.
António MR Martins
Árvore seca
16 - Carlos Teixeira Luís
Sou
uma árvore seca.
Seca
de poeira e sol.Ardente de pedra.
Sou uma árvore seca
Jazendo no caminho dos
Caminhantes.
Onde
a minha sombra arde.
Aqueço-meCom o respirar dos cactos
Castanhos,
Com o olho atroz
Do lagarto fugitivo.
Cobra
de sonho de gelo,
Vinde
à toca curvilíneaAlimentai-vos por meses.
Debaixo da árvore seca.
Seco é o sol
Dos passos de quem aqui morre.
in livro “
HISTÓRIAS DO DESERTO”, página 18, edições Atelier Produção Editorial, Vila Nova
de Famalicão, 2009.
Este é um
pedaço de um extraordinário livro de palavras maiores, de poesia e prosa
(pensantes), e de uma relevante interpretação da escrita. Eu o apresentei, mais
a minha amiga escritora Vera Sousa Silva numa sessão de enorme partilha. Este livro
é um autêntico tesouro literário.
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
Esse teu traço
Imagem da net.
Ai,
menino esse teu traço
terminado
entre uma flor,representa terno abraço
envolvido em tanto amor.
Misto
de magia, encanto,
nesse
olhar tão carinhoso,mesmo débil, és um espanto,
um ser assaz delicioso.
Te
encaram pelas tristezas
que
da vida são mesmo tantas,perante muitas incertezas
lindas emoções nelas plantas.
Muito
atento e lutador
aprendendo
por esta vida,ternurento e demais valor
realças poesia relida.
Não
te sobram outros defeitos
pelas
qualidades que tu tense teus dogmas estão sujeitos
à maldade que somos reféns.
Há
que ter regular atenção
pelos
teus enigmas humanos,falando-te com o coração
com pureza e sem enganos.
Que
teus pais sempre te adorem
entre
teu semblante e teu ser,que muito amor te aflorem
pois deles vieste a nascer.
Por
vezes um simples sorriso
eleva
a nossa presença,um mero olhar indeciso
pode fazer a diferença.
António MR Martins
Apolo
15 - Edgardo Xavier
Vens
do fundo desta noite
Como
uma aurora vibranteTrazes-me o sol e o tempo
Doces
Como
mel a escorrerDa memória
Vens
do fundo desta noite
E
do centro da glóriaLavar-me o olhar
De silêncios e deserto
Desperto
Sou a tua seara em flor
O teu azul do mar
O teu céu
Sou o Apolo que viaja
Nos teus olhos
in livro “Corpo de
Abrigo”, página 44, edições Temas Originais, Coimbra, 2011.
domingo, 16 de dezembro de 2012
“Atlanticidade”
Funchal - Ilha da Madeira
Imagem in 1001imagens.blogs.sapo.pt
I
Há um oceano
Que separa
as margens do silêncioEm cada descoberta emergente
Onde os cascos das caravelas
Solidificaram um espaço
Hoje fora de todo o tempo
II
Há um
navegar precioso
Ultraje de
tantas contendasNa interferência de tantos ideais
Numa junção incompleta
Jamais aceite pelo mundo
Aos olhos das cruéis tormentas
III
Há um
encontro de esperança
Ateado pela
insegurançaE pelos prémios da revolta
O sentido único é a baía
No albergue de tantos navios
Portadores da mensagem
IV
Há esse mar
tão profundo
Que Camões
tanto exultouNa palavra da envolvência
Ai grandioso Portugal
Que te ultimas no desencanto
Em que abandonas tuas ilhas
V
Há um
caminho marítimo
Nas preces
dos marinheirosQue se perderam no tempo
Olvidado por tantas gestas
Na troca vil da ganância
Que as levou para outros mares
VI
Há um
Atlântico perdido
Em tanta
imensidãoOnde a história já pernoita
Águas de tantos segredos
Vitórias de muitos contrastes
Que a memória dissipou
VII
Há o mar da
coragem
Mensageiro
da ribaltaNum apogeu de um abraço
Que nas falésias embate
O pulsar de suas ondas
Com tanta sofreguidão
VIII
Há a
separação nesse mar
Onde se une
toda esperançaNo encanto de cada chegada
A partida noutro instante
Torna a dividir no vazio
Cada culminar da união
IX
Há um
preceito na origem
No âmbito de
cada destinoComo mito da descoberta
De João e de Tristão
Imbuídos pelo esplendor
De ver terra no Atlântico
X
Há uma
pérola oceânica
Num
Atlântico de virtudesOnde a ponte é espontânea
Tal como o Continente anseia
Pelo caminho mais fraterno
Rumo à Ilha da Madeira
Nota:
- Este trabalho foi elaborado a partir de um convite, que me foi feito, e entregue
aos CEHA – Centro de Estudos de História do Atlântico, a fim de fazer parte do conteúdo
de uma obra a ser publicada no final de 2011, sobre o Atlântico e a Ilha da
Madeira, no seu interagir com o Continente, mediante determinados conceitos e
pressupostos que, antecipadamente, me foram apresentados. Por dificuldades
financeiras não chegou a ser editada, como tal, e com a devida autorização, aqui
estou a publicá-la, na íntegra, divulgando-a.
Subscrever:
Mensagens (Atom)